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Ex-Fla chega ao Mundial com "causos"

Era a estreia do novo camisa 10 do time rubro-negro. E logo em um jogo decisivo: quartas de final do principal torneio continental. Vitor Saba teve boa participação, mas ficou marcado por um lance polêmico no fim do jogo, quando provocou a expulsão de um rival e virou alvo da fúria de um treinador campeão mundial.

A história poderia ter sido no Flamengo, na Libertadores, com algum técnico sul-americano de renome. Mas aconteceu com Vitor do outro lado do mundo: era sua estreia pelo Sydney Wanderers, da Austrália, pela Liga dos Campeões da Ásia, e seu novo desafeto era o italiano Marcelo Lippi, do chinês Guanghzou Evergrande. Um exemplo do diferente rumo que tomou a carreira do meio-campista carioca.

- No fim do jogo, recebi uma falta, e o chinês botou o pé na minha cara e foi expulso. O Lippi entrou em campo, foi expulso, reclamou, depois, no vestiário, quis brigar comigo. Bateu no meu peito. Me xingou, falou que eu tinha simulado. Não fiz nada. Fiquei quieto, rindo, deixei ele falar as besteiras dele. Acho que isso até o irritou mais – contou o jogador, ao receber a reportagem do GloboEsporte.com no hotel em que o Wanderers está hospedado, em Rabat.

Vitor tem 24 anos, foi revelado pelo Flamengo, mas, como muitos outros, teve pouquíssimas chances de se firmar. Foi emprestado ao Vitória, depois partiu para o Brescia, da segunda divisão italiana, e chegou ao Sydney Wanderers em junho deste ano, com status de grande contratação. De cara, ajudou a equipe a ser campeã asiática e se garantir no Mundial de Clubes, pelo qual o time estreia no próximo sábado, contra o Cruz Azul, pelas quartas de final.

Nestas aventuras por diferentes partes do mundo, o jogador diz que mudou a cabeça. Largou o videogame, intensificou a leitura, decidiu até abrir uma marca de roupas. É da cabeça do meio-campista que saem as ideias para a coleção. Assim, diz que consegue desviar um pouco a atenção do futebol.

- Eu não vejo jogo, não tenho televisão, porque preciso ter uma válvula de escape. No momento, minha válvula de escape é o meu negócio, que estou começando, minha marca de roupas na Austrália. É bom pensar em outras coisas, estar com a cabeça em outra fonte de renda. Sempre tive essa ideia. É uma aventura nova que estou começando. São camisas que você pode usar em qualquer lugar, praticamente. Casaco, boné... Uma coisa diferenciada. Mais voltada para o futebol, também. Alguns designs são muito voltados para o futebol. Eu estou fazendo a maior parte das coisas. Eu tenho pessoas que me ajudam, mas eu falo a ideia que quero e depois as coisas acontecem.

Saba é um dos dois brasileiros que estarão no Mundial de Clubes – o outro é Marcelo, lateral do Real Madrid. Admite que imaginava chegar à competição de outra maneira, não por um clube australiano fundado há apenas dois anos – torcedor do Flamengo, ficou chateado por não ter sido aproveitado. Mas está satisfeito com a carreira e a chance de buscar novos caminhos.

- Eu gostaria de girar o mundo jogando em outros times. A cultura que você adquire, aprender uma nova língua, conhecer novos lugares... Agora, na África, já joguei em todos os continentes. Quantas pessoas podem dizer isso? Isso é legal, nada paga.

Confira outros trechos da entrevista:

GLOBOESPORTE.COM: Como você chegou no Sydney?

Vitor Saba: Quando eu estava no Flamengo ainda, no início de 2012, estava querendo sair, o Flamengo não queria me liberar, e pintou essa oportunidade de ir para o empréstimo para o Wanderers. O treinador me ligou, estava interessado que eu fosse para lá, e o Flamengo aceitou. Já estava tudo certo, já estavam para mandar a passagem aérea, quando o cara que estava fazendo a mediação me ligou, disse que havia pintado o Brescia, uma oportunidade muito boa. Fui para a Itália. Nos dois anos que estive na Itália, o treinador do Wanderers continuou me acompanhando, me mandando mensagem, perguntando como eu estava. Em janeiro desse ano eu já não estava feliz no Brescia, ele me ligou, perguntou se dava para fazer a transferência. O problema é que na Austrália eles não podem pagar transferência, é como na MLS. Conversei com a diretoria para ser liberado, mas eles pediram 100 mil euros. No fim das contas, eu paguei do meu bolso para me liberarem. Eu tinha estudado o time, a liga, vi que não era uma liga ruim. Financeiramente, eu ia ganhar mais do que na Itália. Vi que seria um desafio bom para mim. Até agora tem dado certo.

O Sydney Wanderers tem apenas dois anos de existência. Como é este projeto?

A parte sul de Sydney tem o Sydney FC, o time no qual o Del Piero jogou. E a parte oeste é muito grande, é mais pobre, tem muitos imigrantes. É onde o pessoal gosta mais de futebol. Por isso que nossa torcida é bem parecida com o Brasil, com a Europa, é diferente de todos os outros times. São pessoas croatas, turcas, brasileiras, argentinas. É uma mistura completa. Em dois anos, muito do sucesso foi parte desta base dos torcedores, que são muito ligados ao time. Nosso estádio está sempre lotado. Se você vai nos outros estádios, o pessoal é muito mais família, bate palma, grita "ó". No nosso estádio tem tambor, tem tudo.

Você é o único brasileiro do Mundial, além do Marcelo. Esperava chegar ao Mundial desta maneira?

Não. Quando você é jovem, você imagina que vai disputar o Mundial pelo Real Madrid (risos). Eu nunca imaginei que eu viria por um time da Ásia, mas por um time da Europa ou da América do Sul. É uma situação diferente, mas eu sempre gostei de desafio, de coisas diferentes. Para mim, é muito bom. Saber que só eu e o Marcelo somos os únicos brasileiros do Mundial é história, né? Uma coisa curiosa, legal. Eu me sinto bem.

E você pode encará-lo na semifinal...

Eu espero, né? Eu conheço um pouco mais o futebol mexicano do que os outros companheiros, já falei para eles que os mexicanos são rápidos, técnicos. Sabemos que vai ser uma partida muito difícil, mas no fim, estamos sempre pensando que podemos ganhar. Enfrentar o Real Madrid vai ser um sonho.

Vocês surpreenderam na Champions asiática. Não eram favoritos e venceram times com mais tradição.

Um time com dois anos de história, primeira participação na Liga dos Campeões... Não era favorito. A gente foi sempre quebrando tabus. Eu participei só da segunda fase, pois cheguei em junho. Jogamos contra o Guangzhou, o time mais rico da Ásia, pegamos o Seoul, finalista da última edição, enfrentamos o Al Hilal, time do Thiago Neves... Acho que isso ajudou muito: ser o azarão. Porque dava mais força, a gente dava 100% nos jogos. Foi um milagre.

Vocês já estão especialistas em ser a zebra...

É até melhor a gente ser a zebra (risos).

Qual foi o momento que você viu que dava para ser campeão asiático?

Quando a gente ganhou do Guangzhou. Foi a minha estreia, a gente ganhou o jogo e teve polêmica comigo...

Por quê?

No fim do jogo, recebi uma falta, e o chinês botou o pé na minha cara e foi expulso. O Lippi entrou em campo, foi expulso, reclamou, depois, no vestiário, quis brigar comigo. Bateu no meu peito. Me xingou, falou que eu tinha simulado.

Como você reagiu?

Não fiz nada. Fiquei quieto, rindo, deixei ele falar as besteiras dele. Acho que isso até o irritou mais.

Você é cria da base do Flamengo, mas teve pouquíssimas chances no profissional. Você saiu chateado?

Sim. Eu e minha família somos rubro-negros. Eu sou Flamengo desde pequeno. Eu cheguei no profissional e tive poucas chances. Quando tive, foi jogando na lateral esquerda. O que eu tenho a dizer sobre minha passagem é que fico um pouco chateado pelo modo como fui aproveitado. Acho que poderia ter tido mais chances. Acho que a gestão do Vitor Saba pela diretoria do Flamengo não foi a melhor. Mas eu não tenho mágoa, não me arrependo de nada, porque hoje em dia estou feliz. Aprendi muito ali. Sempre fui bem tratado. Mas não posso negar que machucou um pouco. Na chance que tive, contra o Palmeiras, entrei no primeiro tempo e acho que fiz uma boa partida. Acho que não ter chance depois de ter provado que tinha qualidade para estar ali... Eu me senti um pouco mal na época. Hoje em dia já superei, não penso mais nisso.

Por que você acha que tanta promessa do Flamengo não vinga, não é aproveitada pelo próprio clube?

Porque no Flamengo, não só lá, mas o futebol brasileiro não sabe gerir os jogadores jovens. Posso falar com 100% de certeza que no Flamengo eles não sabem gerir. Eles querem colocar um jogador jovem, e ele tem que dar certo, ser o novo Neymar. Botam pressão no jogador quando tem 17, 18 anos E não é assim. Pela experiência que tive na Europa e aqui, vi a diferença de gestão das diretorias. Eles têm cautela para colocar o jovem progressivamente no profissional. Tratam isso como "business", para botar o jogador na vitrine e vender. Sabem quando colocar, quando tirar. Acho que o problema real é de gestão. O que acontece no Flamengo, e eu conheço bem a base de lá, é que eles esperam sempre milagre de jogadores jovens. Quando colocam um jovem, queimam o jogador por essa falta de habilidade na gestão. Não é todo jovem que vai fazer diferença. Outra coisa no Brasil é que a mídia bota o jogador jovem no alto muito cedo. A gente sabe que os jogadores brasileiros não têm cabeça para poder ter esse status tão jovens. Infelizmente, tantos jogadores muito bons são jogados fora.


Fonte: Globo Esporte


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