Os currículos são vitoriosos,
a identificação com os clubes é evidente,
mas ainda assim Vanderlei Luxemburgo e Levir Culpi tiveram
a desconfiança como companheira inseparável
ao serem escolhidos para dar novos rumos a Flamengo e
Atlético-MG em 2014. Ultrapassados e decadentes
foram alguns dos adjetivos mais repetidos diante da coincidência
de assumirem os clubes que comandavam há quase
duas décadas, em 1995. O tempo, no entanto, se
encarregou de sepultar, um por um, os questionamentos.
Nesta quarta-feira, os treinadores se encontrarão
no Maracanã pela semifinal da Copa do Brasil, possibilidade
de encerrar com um troféu uma temporada já
bem sucedida para os "velhinhos", que estão
novamente em alta no mercado.
Mesmo em situações bem distintas,
Flamengo e Atlético-MG viviam momentos de passividade
diante de resultados ruins. Não seria absurdo dizer
que Vanderlei e Levir ressuscitaram equipes que observavam
o horizonte carentes de perspectivas para temporada. Na
Gávea, o inédito rebaixamento assustava,
e muito, um clube que chegou ao fundo do poço na
lanterna do Brasileirão. Já na Cidade do
Galo, a perda do Estadual para o Cruzeiro encontrou eco
na derrota para o Nacional de Medellín, na primeira
partida das oitavas de Libertadores, e no iminente fim
do ciclo de Ronaldinho Gaúcho.
O duelo pela semifinal de uma competição
nacional deixa claro que os treinadores conseguiram renovar
a esperança dos torcedores que encerraram apreensivos
o primeiro semestre. No Fla, o risco de rebaixamento quase
não existe mais e a possibilidade de repetir o
roteiro do ano passado, com o título da Copa do
Brasil, empolga uma torcida que acostumou-se a encher
o Maracanã desde a chegada de Luxa. No Galo, a
volta por cima foi ainda maior. Se não conseguiu
salvar a participação na Libertadores, Levir
conquistou a Recopa e comanda um time com a melhor campanha
do segundo turno do Brasileirão, onde é
vice-líder, sete pontos atrás do rival Cruzeiro.
Luxa cria "zona da confusão"
e devolve paz ao Fla
Em sua quarta passagem como treinador do
Flamengo, Vanderlei Luxemburgo encontrou terra quase arrasada
ao se apresentar no Ninho do Urubu, no dia 24 de julho.
Substituto de Ney Franco, encontrou um elenco devastado
pela goleada de 4 a 0 sofrida para o Inter e que tinha
acabado de perder dois de seus jogadores mais experientes:
Elano e André Santos. Alvos da ira da torcida,
ambos tiveram seus contratos rescindidos, com o lateral
tendo sido até mesmo agredido por torcedores depois
da derrota no Beira-Rio.
Logo em sua primeira entrevista, Vanderlei
tratou de trabalhar o psicológico do grupo. Deixou
claro que não esperaria reforços e contava
com aqueles jogadores para tirar o Flamengo da "zona
da confusão", termo inventado para evitar
a palavra rebaixamento. Deu certo. Não demorou
muito para que o elenco abraçasse o professor e,
com seis vitórias em sete jogos, o Rubro-Negro
passou a respirar aliviado.
Com Vanderlei, o Fla conquistou 33 dos 40
pontos que tem no Brasileirão e renasceu na Copa
do Brasil ao devolver no Maracanã uma goleada por
3 a 0 sofrida para o Coritiba, nas oitavas de final. O
treinador comandou o time em 24 jogos, com 58,3% de aproveitamento
(13 vitórias, três empates e oito derrotas).
Luxa, por sua vez, não vê a passagem pela
Gávea como uma volta por cima e diz que o trabalho
segue uma tendência apresenta por ele próprio
e Levir Culpi ao longo da carreira.
- As pessoas analisam muito momentaneamente.
Não fiquei nem melhor, nem pior. Continuo sendo
o Vanderlei, um profissional que busca espaço,
que conquista, que faz as coisas acontecerem. É
que você vem muito tempo em primeira linha e o desgaste
é natural. O Levir ficou muito tempo fora do Brasil,
mas quando estava aqui sempre chegou nas finais, ganhou,
teve bons trabalhos. Ele optou por ficar fora, eu optei
por ficar aqui. Tive dois trabalhos ruins, no Atlético-MG
e no Fluminense, e isso ficou marcado. Agora, voltei aos
trabalhos normais que estou acostumado a fazer e estamos
seguindo bem, mostrando a nossa qualidade. A análise
tem que ser ao longo da trajetória. Ele tem um
currículo invejado, eu também tenho, temos
histórias no futebol, e isso é legal.
Levir prova que há vida sem
Ronaldinho
Escolhido para a vaga de Paulo Autuori,
Levir Culpi voltou a Belo Horizonte não somente
com o desafio de recolocar o Atlético-MG em ordem.
O treinador precisava também se recolocar no mercado
nacional depois de sete anos no futebol japonês.
E o início foi duro. Depois da derrota para o Grêmio,
fora de casa, na segunda rodada do Brasileirão,
o comandante viu o Galo ser eliminado da Libertadores
com um empate com o Nacional de Medellín diante
de um Independência lotado. Era o fim do sonho do
bi.
Respaldado pela diretoria, Levir manteve
suas convicções, levou o Atlético-MG
ao emocionante título da Recopa Sul-Americana,
contra o Lanús, no Mineirão, e mostrou força
ao tornar o time ainda mais competitivo depois do adeus
de Ronaldinho Gaúcho. Assim como Luxa, está
na quarta passagem pelo clube e conta com incríveis
62,16% de aproveitamento (sem contar os amistosos na China)
em 37 jogos. Com 24 pontos, o Galo é o melhor time
do segundo turno do Brasileirão e, mesmo à
distância, pressiona o rival Cruzeiro.
Mesmo com números incontestáveis,
Levir Culpi evita chamar para si o mérito do bom
momento do Atlético-MG. De discurso humilde, coloca
na conta do elenco e se derrete pela dedicação
dos jogadores durante as partidas.
- Os jogadores estão à minha
frente. O meu trabalho está se resumindo a palestras,
a vídeos e a escalação. O mérito
maior fica com o desempenho do elenco. Se nós considerarmos
o elenco que começou o ano e o grupo que está
agora, com muitas mudanças, é natural que
(o desempenho) caia um pouquinho. A maior dificuldade
que temos é de dar o conjunto. Agora, o espírito
do grupo está legal. Eles estão dentro do
espírito do Atlético-MG. É sempre
jogo difícil, ganhar sempre com muito suor, sempre
tem uma coisa perigosa correndo em volta e no final dá
tudo certo. Esse é o espírito do Atlético-MG.
Já sessentões, Vanderlei Luxemburgo
e Levir Culpi estarão frente a frente nesta quarta-feira,
no Maracanã, e na seguinte, no Mineirão,
disputando uma vaga na decisão da Copa do Brasil.
Apenas um deles terá pela frente Cruzeiro ou Santos,
mas ambos certamente vão terminar o ano com motivos
para comemorar. Foi questão de tempo para que mostrassem
que ultrapassados e decadentes são adjetivos que
não lhes cabem. Um tempo curto. Tão curto
que não foi necessário voltar ao longínquo
ano de 1995 para que rubro-negros e atleticanos lembrassem
de como são bons.