Os constantes atritos entre correntes de
oposição e a diretoria do clube tiveram
na noite de quinta-feira um novo episódio. Membros
da comissão que analisa a reforma de estatuto do
Flamengo foram barrados pela secretaria do clube, por
não terem quitado a cota extra imposta pelos gestores
para pagamento de dívidas de IPTU e com a Cedae,
que totalizam R$ 2,3 milhões. Opositores, que fazem
parte da comissão, consideram ilegal a cobrança
da cota extra de R$ 35,90 por associado e, portanto, se
recusam a pagar. A assessoria do Flamengo confirmou o
incidente, mas alegou que houve bloqueio automático
do sistema, que acontece quando qualquer associado atrasa
por determinado período o pagamento, incluindo
a cota extra.
O grupo barrado chegou a cogitar ir para
a delegacia registrar um boletim de ocorrência para
servir de documento para uma possível ação
judicial, mas obteve autorização para entrar
no clube, por ora, somente para dar prosseguimento ao
trabalho da comissão. Líderes da oposição,
como o membro do Conselho Fiscal Gonçalo Veronese
estão orientando sócios barrados a fazer
o registro. Há possibilidade de moverem ação
para obter acesso livre e suspender a cota extra. Outros,
que não estiveram o clube, também devem
contestar a cobrança na Justiça. O advogado
Ércio Braga, ex-diretor jurídico do Flamengo,
é um deles. Diz já ter em mãos procuração
de um conselheiro e que deverá entrar com a ação
na próxima terça-feira caso nada mude.
Após os membros da comissão
terem sido barrados, o grupo foi liberado com restrições
e a reunião da comissão de estatuto aconteceu.
O clima foi de tensão e discussão entre
opositores e membros do SóFla (Sócios pelo
Flamengo, grupo que sustenta a atual gestão). Os
opositores tomam como base o primeiro artigo do estatuto
rubro-negro
Diz o artigo 1: "(...) caracterizado
por entidade de prática desportiva, constituído
por prazo indeterminado, de personalidade jurídica
distinta de seus associados, os quais não respondem,
solidária ou subsidiariamente, pelas obrigações
contraídas pelo Flamengo, regendo-se pelo seu Estatuto
Social e pela legislação vigente".
Em seguida, há a referência de que a redação
atual do documento foi aprovada na reunião de 14
de abril deste ano pelo Conselho Deliberativo, em ajuste
à legislação proposto e defendido
pela atual diretoria para que o clube pudesse se beneficiar
de lei de incentivo.
O artigo que, segundo a diretoria, permite
a cota extra é o 125, XIV, que fala nas atribuições
do Conselho Diretor e cita "fixar valor e estabelecer
forma de pagamento de joia, anuidade, mensalidades e taxas,
observadas as disposições deste Estatuto".
A argumentação consta em email enviado pela
diretoria aos associados do clube.
O presidente do Conselho Deliberativo, Delair
Dumbrosck, confirmou ter negociado a liberação
do grupo e afirmou que a diretoria poderia ter maior habilidade
para conduzir a questão. Ele revelou que representações
já estão sendo feitas e que a comissão
jurídica analisará a questão.
- As pessoas que foram barradas, elas pagaram
a taxa de manutenção do clube. Foram barradas
por essa cota extra que está sendo questionada
por diversas pessoas. Eu questionei com o Bandeira que
era uma posição discutível, ele resolveu
liberar com a observação de que não
poderiam usar as dependências do clube. Eles estão
inclusive apresentando representações no
Deliberativo a respeito e a comissão jurídica
vai analisar. Eles deveriam ter mais habilidade para tomar
uma decisão dessa.
Dumbrosck preferiu não opinar quando
questionado se considera legal a cobrança da taxa,
de acordo com o estatuto, mas teme que seja um precedente
perigoso.
- Eu não posso emitir esse parecer,
porque vai ser da comissão jurídica. Particularmente,
acho que o Flamengo nunca teve isso e abre um precedente
muito grande. Amanhã o Flamengo é condenado
a pagar R$ 40 milhões ao Ronaldinho, resolve emitir
uma cota extra, como fica?
Conselheiro acusa SóFla,
que rebate
Francisco Gularte, membro da comissão
que foi barrado na sede do clube, relatou que a reunião
do grupo que debate o estatuto de fato foi confusa, com
discussões entre a oposição e o SóFla.
- Depois de uma hora e meia de negociações,
o presidente do Deliberativo e o presidente da comissão
foram no Bandeira (Eduardo Bandeira de Mello, presidente
do Flamengo) pedir a liberação dos membros
da comissão para que a reunião ocorresse.
Ele liberou, desde que a gente não usufruísse
do clube. O clube que não tem piscina, não
tem nada. A gente tinha de subir direto para trabalhar.
A reunião foi uma confusão porque, segundo
o SóFla, não existe um consenso para aprovar
a reforma estatutária que está sendo proposta,
que é a responsabilidade fiscal dos dirigentes
do Flamengo. E aí a gente começou a discordar
porque o SóFla se elegeu com a bandeira de moralização
do clube e não quer votar a moralização
do clube.
Gularte também acenou com uma ação
judicial caso a situação não se resolva
até o início da semana.
- Se até segunda-feira essa situação
não estiver regularizada, a cota extra não
tiver sido suspensa, vamos recolher assinatura para entrar
na Justiça e acabaram os trabalhos de estatuto,
porque não cumprem nem o artigo 1 que eles mesmos
mandaram modificar - disse Gularte.
Informado das declarações
de Gularte, o SóFla se manifestou e enviou sua
posição.
- O SóFla apoia as medidas de austeridade
e responsabilidade financeira da atual diretoria, que
tem competência estatutária para estabelecer
taxas extras aos associados. O clube vive uma crise financeira,
como é de conhecimento geral, e mais de 70% dos
sócios entenderam a razão dessa cobrança
e efetuou seu pagamento.
Sobre o estatuto do clube, o SóFla
declarou:
- O Clube vive um momento salutar de discutir
a reforma do seu Estatuto, que já tem 22 anos.
O SóFla apoia todas as medidas que importem profissionalismo
e responsabilidade na gestão administrativa e orçamentária,
que estejam em conformidade com a legalidade regimental.
Tanto que apresentou o projeto de Estatuto “Conte
Comigo, Flamengo”, que possui o mais moderno capítulo
sobre orçamento dentre os clubes do Brasil. É
conhecido no clube como a “Lei de Responsabilidade
Fiscal Rubro-Negra” e conta o apoio quase unânime
da situação e oposição. Entendemos
que será questão de tempo sua aprovação.