A contratação de Anderson
Pico foi anunciada pelo técnico Vanderlei Luxemburgo
durante entrevista coletiva depois de comandar treinamento
no Ninho do Urubu. Tratou a situação como
a chance de recuperar um jogador no qual acredita pelo
talento, mas não deixou de mostrar conhecimento
sobre o outro lado do jovem que conheceu no Grêmio
há dois anos ao defini-lo como um fio desencapado
de 220 volts.
Anderson Pico não foge da expressão
dada pelo treinador. Luxemburgo é quem acredita
em sua volta por cima, que o jogador vai conseguir se
estabelecer no futebol. Ele agradece, mas a chance de
vestir a camisa do Flamengo não foi absorvida completamente
por quem se sentia abandonado em Porto Alegre. A ficha
ainda não caiu.
– Sou (um fio desencapado), sim. Dentro
do campo sou mesmo um fio desencapado. Minha vida é
jogar no Flamengo. Durmo, acordo e só penso em
Flamengo. Sonho com o Flamengo. É a minha vida
e da minha família – afirmou Anderson Pico,
de 25 anos, ao GloboEsporte.com.
Essa motivação vem do nascimento
do segundo filho, marcado para quinta-feira. Gabriel é
fruto do relacionamento com Fabiana. Pico já é
pai de Pedro, de 5 anos de idade. Sua mulher ficou em
Porto Alegre, e o jogador já está há
um mês longe de casa sem saber se poderá
acompanhar os primeiros dias do novo membro da família.
– Minha mulher é minha parceira.
São poucas no futebol que você vai encontrar
assim. É guerreira mesmo. Na situação
ruim nunca me deixou de lado. Sempre me incentiva. Queria
estar lá para ver o nascimento. Se o professor
autorizar, eu vou. Caso contrário, fico aqui. Ela
entende que meu trabalho está em primeiro lugar
nesse momento – comentou o jogador.
Para correr atrás de seu objetivo,
Pico pegou um ônibus em Porto Alegre, encarou um
dia de viagem e se hospedou na casa de um amigo no Recreio.
Foi em busca do telefone de Luxemburgo, conseguiu e demorou
a conseguir contato. Acompanhando os jogos do Flamengo
pela televisão, viu no clube uma esperança
de renascer para o futebol depois de deixar o Grêmio
e passar por uma série de clubes de menor expressão
do futebol brasileiro.
– Estava vendo um jogo do Flamengo
e falei com minha mulher que minha oportunidade estava
ali. De um dia para o outro, peguei um ônibus e
cheguei no Rio. Queria pedir uma oportunidade a ele. Como
já havia acontecido no Grêmio, onde acabei
não me cuidando como deveria. Mandei mensagem,
mas ele não respondeu. Fiquei meio assim, mas arrumei
uma academia e comecei a treinar das seis da manhã
às sete da noite, sem domingo. Queria falar pessoalmente
com o Luxemburgo, sem intermediários, sabia que
ele gostava disso. Tenho plena consciência do que
fiz lá atrás. Consegui falar e deu certo.
Está me dando esse voto de confiança num
clube como o Flamengo – contou.
Um dos problemas enfrentados por Pico no
passado foi em relação ao peso. Com uma
dieta rigorosa no Flamengo, ele toma seu chimarrão
pela manhã, encara saladas e peixe no almoço,
fruta, verdura e muita água. À noite, melancia.
– É suco de melancia, melancia
com melancia e mais melancia – brincou Pico, que
disse estar a três quilos do peso com o qual jogava
no Grêmio em 2012, quando era comandado por Luxemburgo.
Domingo, na vitória por 1 a 0 sobre
o Corinthians, Pico acompanhou a delegação
e esteve no vestiário. Pela primeira vez, assistiu
a um jogo do novo clube e ficou impressionado com a torcida
e o estádio, onde ainda não havia ido desde
a reinauguração.
– Nunca vi nada igual. Uma loucura,
e isso com três pontos – disse o jogador,
que teve o nome publicado no Boletim Informativo Diário
(BID) da CBF nesta terça-feira e já está
regularizado, faltando apenas a condição
física para entrar em campo.
Além do Maracanã, Pico prefere
se manter discreto. Recentemente, parou de treinar dois
períodos depois de dias intensos de atividade.
Melhor para manter a cabeça apenas no campo e deixar
os atrativos fora dele em segundo plano.
– Poderia estar numa situação
melhor, mas não me arrependo. Deixei as coisas
fora de campo de lado. Se no passado tivesse a cabeça
que tenho hoje, com a mentalidade de só jogar futebol,
(a história) seria diferente. Vim pensando só
nisso, depois penso em desfrutar da praia. Quero conquistar
meu espaço com honestidade – comentou.
Nem eu acredito que estou no Flamengo
Pico, empolgado
Contratado para defender o Flamengo até
o fim do ano, Pico já tem a possibilidade de renovação
por mais duas temporadas. Para isso, precisará
mostrar numa disputa com João Paulo que tem condições
de ser lateral-esquerdo do Flamengo. Pouco mais de dois
meses para alcançar o seu objetivo.
– Todo jogador quer vestir a camisa
do Flamengo, e comigo aconteceu de uma hora para outra.
Não posso deixar escapar e vou fazer das tripas
coração para dar certo. Vai ser maravilhoso.
É uma coisa inexplicável. Tudo ou nada para
mim. Estava uma coisa meio chata no Sul, ninguém
acreditava mais. Vim para outro estado, outra cultura,
e estou me adequando aos treinos que pedem para voltar
a minha vida de atleta. Sempre querendo algo mais, sei
que vou colher bons frutos – afirmou.
Com o corpo marcado por tatuagens, como
uma caveira na mão direita e nomes de seus entes
queridos espalhados, Pico precisa arrumar um lugar para
o nome de Gabriel. Quem sabe em um outro momento de sua
vida.
– É um momento ímpar.
Ninguém acredita. Nem eu acredito que estou no
Flamengo.