Dentro de campo, o Flamengo se recuperou
com Vanderlei Luxemburgo. Nos bastidores, não.
A guerra interna continua intensa, com manobras de situação
e oposição, especialmente nos conselhos
Fiscal e Deliberativo. No primeiro, os membros eleitos
pela oposição conseguiram a abertura de
uma comissão de inquérito contra o presidente
Mario Esteves. No Deliberativo, o grupo de apoio político
da diretoria entrou em rota direta de atrito com o presidente
Delair Dumbrosck depois de um comunicado aos associados
sobre as reformas do estatuto que, segundo os opositores,
causou mal-estar. Dumbrosck, por sua vez, fala que o grupo
Sócios pelo Flamengo (SóFla) – principal
base de apoio político da diretoria – está
trabalhando contra o clube e rebate o comunicado.
A comissão de inquérito no
Deliberativo – para apurar denúncias de que
Esteves restringia informação aos membros
do Conselho Fiscal eleitos pela oposição
– deve ter sua primeira reunião nos próximos
dias, segundo Dumbrosck. Esteves, contudo, pediu uma licença
de 60 dias, justamente o prazo que a comissão teria
para apurar as denúncias. Para Gonçalo Veronese,
membro do Conselho Fiscal e um dos autores do pedido de
abertura do inquérito, trata-se de uma manobra
para ganhar tempo, já que, nesse período,
ele poderá deixar de responder à comissão,
mas esta também poderá pedir a prorrogação
do prazo até que ele volte.
– Com certeza vai atrasar –
disse o conselheiro, afirmando que os motivos alegados
foram questões particulares.
Dumbrosck explicou o motivo de autorizar
a abertura da comissão, que deverá iniciar
seu trabalho nos próximos dias:
– Quando a oposição
consegue, na eleição do Conselho Fiscal,
um determinado percentual de votos, ela tem direito a
ter dois membros e dois suplentes. A partir daí,
acabou. É um conselho só, todos os membros
têm os mesmos direitos e deveres. Mas estava havendo
reclamação de que os membros que eram da
oposição não estavam tendo acesso
a nada, e por isso abri a comissão para apurar.
Questionado se a licença de Esteves
tem relação direta com a abertura da comissão
de inquérito, ele preferiu não opinar:
– Aí tem de perguntar a ele
– aconselhou.
A reportagem não conseguiu contato
com Mario Esteves, tampouco obteve retorno a partir de
recado deixado em seu telefone. Foram feitas três
ligações na tarde desta sexta-feira, e em
todas o número estava fora de área.
Contra-ataques da situação
Em outra frente, Veronese também
sofre contra-ataque. Dumbrosck recentemente esteve de
licença da presidência do Deliberativo, que
foi conduzido por Rodrigo Dunshee de Abranches. Nesse
período, também foi reativada uma comissão
de inquérito contra o conselheiro por suposto vazamento
de documento interno do clube, o que Veronese nega. A
investigação foi aberta em maio por 25 membros
do SóFla, de acordo com Veronese, que afirma estar
em vias de processar todos os autores em ação
que promete impetrar na próxima semana.
– Isso já estava arquivado,
eles (membros do SóFla) aproveitaram a presença
do Rodrigo, que apoia a Chapa Azul (cor que a atual diretoria
usou para se eleger), e conseguiram a abertura da comissão.
Não vazei documento, alguém do meu grupo
pode ter vazado, mas não sei quem foi e nem tenho
interesse em saber.
O principal alvo da atual gestão,
no entanto, continua sendo Leonardo Ribeiro, o Capitão
Léo. Suspenso recentemente em processo no Conselho
de Administração, ele será novamente
julgado, em outro processo interno, provavelmente na próxima
semana. Caso seja novamente condenado, poderá ficar
sujeito à exclusão do quadro social. Por
outro lado, o ex-presidente do Conselho Fiscal também
contra-ataca. Em outra comissão de inquérito
aberta contra ele, Ribeiro saiu vitorioso com o arquivamento
ordenado pelo presidente do Conselho de Administração,
Maurício Gomes de Mattos, alegando "falta
de materialidade". A acusação se referia
ao seu envolvimento na aquisição de um placar
eletrônico que trouxe problemas posteriormente ao
clube, como relatado em reportagem do GloboEsporte.com
em setembro de 2013. De acordo com Veronese, Ribeiro deverá
processar os autores da denúncia no clube, entre
eles o presidente Eduardo Bandeira de Mello.
Polêmica sobre reforma de
estatuto
Nesta sexta-feira, o quadro político
ficou ainda mais acirrado com um comunicado do SóFla
a respeito da reforma do estatuto do Flamengo. No texto,
o grupo faz críticas diretas a Dumbrosck e afirma
que não há consenso para a votação
do que chamam de "duas mudanças pontuais",
por isso não pode ser chamado de reforma de estatuto.
Eles tentam, de certa forma, dar o troco ao presidente
do Deliberativo, que em entrevista ao GloboEsporte.com
no dia 11 de agosto anunciou ter rachado com a atual gestão,
chegando a falar em combatê-la nas urnas em 2015.
Dumbrosck alega que os integrantes do SóFla
são imaturos politicamente e mudam de posição
a todo momento. Segundo o presidente do Deliberativo,
o consenso entre os demais grupos que enviaram propostas
de estatuto vai muito além dos dois itens citados
no comunicado. A próxima reunião do Grupo
de Especial de Reforma Estatutária foi convocada
para a próxima segunda-feira.
– O trabalho está sendo conduzido
com seriedade, os demais grupos, que conhecem bem o Flamengo,
estão tratando sem problemas, mas esse pessoal
do SóFla muda (de opinião) a cada reunião.
Não sou eu nem eles que vamos decidir o estatuto.
Isso quem decide é o plenário. Com essa
postura eles estão trabalhando contra o Flamengo,
não para o Flamengo – disse Dumbrosck.
Confira trecho do documento enviado aos
conselheiros:
"(...) Em junho, houve uma reunião
com representantes dos quatro grupos, com a presença
do Grande-Benemérito Marcio Braga. Nessa reunião,
foi definido que os grupos buscariam esses pontos de consenso
para levar a plenário, a exemplo do que foi feito
na bem-sucedida votação para adequar o Estatuto
atual à Lei Pelé, em abril. Como sugeriram
os Grandes-Beneméritos, buscaríamos mudanças
pontuais, ao longo de um processo cuidadoso e responsável.
"Formou-se, então, o Grupo
Especial de Reforma Estatutária. Ao longo dos últimos
meses, trabalhamos intensamente com os representantes
dos demais grupos para buscar os temas de consenso. Até
este momento, dois trechos do Conte Comigo, Flamengo foram
considerados consensuais: a criação de uma
Comissão Permanente de Processo Disciplinar e uma
Lei de Responsabilidade Orçamentária para
o clube. Poderíamos, pois, encaminhar esses temas
para votação como na adequação
do estatuto à Lei Pelé: esses dois tópicos,
uma vez aprovados, seriam incorporados como emendas ao
Estatuto atual.
"Infelizmente, há um entendimento
por parte do grupo especial que os dois pontos de consenso
devam ser chamados de Novo Estatuto. Aprovar duas modificações
pontuais como se fossem um estatuto inteiramente novo
é distorcer o trabalho que foi realizado. (...)
"Reforçamos que a votação
de um novo Estatuto para o Flamengo, como anunciado à
imprensa pelo presidente do Conselho Deliberativo, NÃO
é consensual. Os representantes do projeto Conte
Comigo, Flamengo não concordam em apresentar duas
mudanças pontuais como se fossem um projeto inteiro.
Não podemos fazer um novo Estatuto a cada reforma
pontual que for proposta, seguindo o calendário
eleitoral, ou o Flamengo teria um Carta Maior a cada dois
anos - gerando toda sorte de instabilidade institucional
para o clube".